7.10.09

Lázaro


“Juventude é uma besta incongruente e cega. Anseia por alimento mas não come, é demasiado tímida para comer.” 
Nikos Kazantizakis – Testamento para El Greco,
 Ed. Artenova, Trad. Clarice Lispector



Lázaro, até que sua arrogância não o inflasse, seguiria a pé até Jerusalém. Há época para todo tipo de acontecimento: para Lázaro o milagre. Ele, senhor de si e dos enganos, convertia pássaros em agonia. Retórico, não era capaz de pensar sem longas perorações: 

"José, o que te direi se não sobreviver?
Que sou um perfeito imbecil?
Teimoso até em minha morte?
Ou que não saberia fazer da vida  metáfora de coisa maior?
Ora, amanhã cedo partirei para outro lugar. Sim. Não sei ainda para onde. Talvez para casa da minha infância."

Desta vez lhes garanto caros, fora uma exceção.
E foi assim que fez, contou moedas e mentiras, teimoso, não esperou pela promessa que lhe fora revelada em sonho, levantou cedo, isso mesmo, da tumba ao berço. Era ansioso demais para aguardar sua própria morte.

E sua viajem não acabava nunca. Dava-se por repetições tão absurdas que, naquele parágrafo em que era arrogante, necessitava conciliar seu choro estridente por sede e cansaço: não saberia com precisão decifrar a agonia de quando criança. Anacrônico, já podia citar Funes, O Memorioso, sem ofender Borges pela frouxidão do seu estilo, ou melhor dizendo, das suas recordações. 

O resultado era uma vida tensa. Ora domador de cavalos, ora contador de histórias estranhas, contribuía com a atualização do Midraxe-hagadá. Capaz de falar de árvores e pássaros. Do vento fresco que lhe tomava a fronde no outono, da água fresca tal vento da frase que passou e tâmaras, muitas delas, sem figurar nada disso como pintura de quadro para liberdade: amava imagens sobre o campo. Isso. Nada. Lázaro.


Henrique Henrique